Aos 36 anos, ela busca um diagnóstico no sistema público de saúde: Conheça a história da jornalista Vanessa Virães

Você já parou para pensar em como é conviver diariamente com inúmeros sintomas clínicos jamais explicados pelos médicos?  Essa é uma frequente realidade no Brasil, não só entre pessoas que buscam um diagnóstico adequado para doença celíaca, mas também em relação a outras restrições alimentares.

A doença celíaca é uma condição autoimune e genética desencadeada pela ingestão de glúten, uma proteína presente em grãos como trigo, centeio, cevada e aveia, que causa um processo inflamatório afetando principalmente o intestino delgado. Ataca as células de defesa do organismo e resulta na atrofia das vilosidades no órgão o que, consequentemente, diminui a capacidade de absorção dos nutrientes.

Estima-se uma prevalência mundial de 1%, ou seja: uma em cada 100 pessoas pode ser celíaca. A Federação Nacional das Associações de Celíacos do Brasil (Fenacelbra), pontua que embora o país não conte com dados oficiais, são mais de 2 milhões de brasileiros celíacos. Além disto, muitos ainda estão sem o diagnóstico oficial.

A doença celíaca não é categorizada como rara, porém, muitos profissionais da área da saúde ainda a tratam desta forma, tanto no setor privado, quanto na esfera pública.

Há aproximadamente três anos, a realidade da jornalista e representante comercial Vanessa Virães, de 36 anos, é a busca por um diagnóstico adequado. Apesar de encontrar semelhanças com os sintomas que já pesquisou sobre a doença celíaca, ela continua sem respostas.

Percebendo que o glúten é um dos seus principais gatilhos, sem esperanças de conseguir um diagnóstico e frustrada com os médicos com os quais se consultou, Vanessa decidiu arriscar por conta própria e retirar a proteína da sua alimentação, com a consciência de que, sem os exames necessários, talvez continuaria sem respostas, até quando, não se sabe.

Mesmo que a recomendação médica seja não retirar o glúten antes do diagnóstico, como julgar alguém que está há anos buscando respostas sem conseguí-las?

“Ainda não tive um diagnóstico médico comprovado. Sou hospitalizada duas vezes por ano com dores fortíssimas abdominais, enjoos, estufamento, gases, inflamação intestinal, entre outros. Preciso sempre entrar no soro para conseguir sanar as dores e o desconforto. Na minha última consulta, foi receitado um antidepressivo, pois entenderam que poderia ser psicossomático, por estresse, ansiedade e depressão. Não tomei o remédio, é claro”, conta Vanessa.

A jornalista não tem convênio médico e depende de atendimento pelo sistema público de saúde que, no Brasil, oferece atendimento acessível a todos. Embora exista um protocolo clínico e diretrizes terapêuticas da doença celíaca, os médicos que, até então, trataram Vanessa, não estão familiarizados com os exames necessários para diagnosticar a doença.

“O atendimento é básico, rápido e sem muito acesso a exames mais específicos. O sistema é ótimo na proposta, mas falho no atendimento e base estrutural de exames, abordagem e análise de casos (de forma humana e individual). É tudo muito rápido e com diagnósticos parecidos, para todas as pessoas. Me senti louca por ter esse diagnóstico de somatização por stress e depressão, e não por uma condição de saúde física. Mas continuo buscando informação, para conseguir ter uma rotina e vida mais normal e prazerosa possível”, explica Vanessa Virães.

De acordo com a Fenacelbra, é necessário ingerir glúten diariamente por dois meses, ao menos para obter um diagnóstico adequado; nos casos em que a pessoa já faz a dieta, é preciso retornar a ingerir sob supervisão médica: isso não foi solicitado à paciente. Entre os exames listados pelo próprio protocolo do sistema público de saúde, apenas um foi solicitado à Vanessa. O respectivo documento explica, ainda, que biópsia do intestino delgado é imprescindível para o diagnóstico definitivo, como explica o trecho abaixo:

“[…] Deve-se enfatizar que, até o momento, os marcadores sorológicos para DC não substituem o exame histopatológico do intestino delgado, que continua sendo o padrão-ouro para o diagnóstico de DC. No entanto, a biópsia intestinal deve ser solicitada mesmo com sorologia negativa nos casos de deficiência de IgA e nos casos com alta suspeição clínica, como nos parentes de primeiro grau de doentes celíacos com sinais ou sintomas compatíveis.”

A biópsia do intestino delgado, entretanto, não foi solicitada à jornalista: foi retirada uma amostra do estômago, região que não corresponde à indicada pelo protocolo para realização do diagnóstico. “Tenho encaminhamento para o gastroenterologista em junho. Vou munida de informações, para tentar realizar os exames corretamente desta vez”, conta.

Além de reagir a alimentos com glúten, Vanessa também percebeu sintomas que acredita estarem relacionados a outras restrições alimentares. Sem apoio e orientação médica, mantém atualmente uma alimentação vegana, restrita e sem glúten por conta própria, a fim de sentir um ‘alívio’ no cotidiano.

Mesmo que seu diagnóstico venha a ser outro, Vanessa defende que a doença celíaca precisa de mais visibilidade não só no sistema público, mas também no que diz respeito às políticas públicas.

“Vivemos dentro de uma caixinha e entende-se ainda, que dieta sem glúten e/ou vegan não são saúde básica, e sim modismo para atender o mercado. Precisamos abordar mais a questão da doença celíaca, levando como uma política de saúde pública e necessária para que todas as pessoas consigam entender os sinais que seu corpo dá. Só quem tem respaldo e entendimento são os beneficiados financeira e socialmente”, finaliza.

 

(Arte: Direitos reservados – Prato Livre)
Foto: Arquivo pessoal | Vanessa Virães)

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